EQUILÍBRIO OU COLAPSO:
por labsul | out 28, 2025 | Publicações
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As apostas de quota fixa (bets) tornaram-se um dos setores mais dinâmicos e promissores da economia digital mundial. No contexto de crescente formalização e fortalecimento de práticas de compliance, o segmento consolida-se como uma relevante fonte de receita e inovação. De acordo com estimativas internacionais, o mercado mundial registrou no último ano um crescimento expressivo de 10,5%, alcançando a marca de US$ 105,5 bilhões. As projeções indicam que esse volume poderá mais que dobrar nas próximas décadas, atingindo US$ 286,4 bilhões até 2035.
No Brasil, o mercado de apostas também vem se consolidando rapidamente, impulsionado em grande medida pela regulamentação recente. Apenas no primeiro semestre deste ano, as apostas de quota fixa geraram R$ 3,8 bilhões em arrecadação para os cofres públicos.
O setor de apostas está se consolidando rapidamente como um dos segmentos mais dinâmicos da indústria global de jogos, com forte ênfase em estruturas de governança, controles internos e monitoramento regulatório, essenciais para a integridade do sistema. Sua escalabilidade está diretamente vinculada à capacidade de interagir com diferentes setores econômicos e tecnológicos, como os de esportes, mídia e entretenimento, segurança digital e inovação tecnológica. Nesse cenário, as apostas esportivas assumem posição de protagonismo: projeta-se que o nicho atinja receita de US$ 77,18 bilhões em 2025. A expectativa é que o número global de usuários alcance 231,9 milhões até 2029.
Essa força econômica vem despertando o interesse estatal. Em 2023, a Lei 14.790 regulamentou o setor, fixando alíquota de 12% sobre a receita bruta (Gross Gaming Revenue - GGR) e impondo regras de compliance e proteção ao consumidor. Porém, menos de dois anos depois, fala-se em elevar impostos, criar novas contribuições e cobrar retroativamente tributos de operadores que atuavam antes da regulamentação. Tal discussão exige cautela sob o prisma da segurança jurídica e da previsibilidade regulatória, fundamentos essenciais para a efetividade de qualquer programa de compliance e para a própria credibilidade do marco regulatório.
O dilema é claro: calibrar a arrecadação para financiar políticas públicas ou sufocar um setor recém-regulamentado, alimentando justamente o mercado ilegal que se busca combater?
A lógica tributária pode, à primeira vista, parecer simples: elevar impostos significaria, inevitavelmente, aumentar a arrecadação.
Contudo, a realidade mostra-se bem mais complexa.
Em grande parte dos casos, o aumento excessivo da carga tributária desestimula a atividade econômica, fortalece a informalidade e ilegalidade e, paradoxalmente, reduz a receita do Estado. A experiência internacional fornece evidências consistentes desse fenômeno e oferece lições estratégicas que o Brasil precisa observar com atenção e responsabilidade.
1. O ALERTA INTERNACIONAL: QUANDO A TRIBUTAÇÃO EXCESSIVA MINA A ARRECADAÇÃO E FORTALECE O MERCADO ILEGAL
A experiência internacional vem demonstrando que o aumento desmedido da carga tributária sobre apostas tem efeitos colaterais perversos: a migração de jogadores para o mercado ilegal e a possibilidade de estagnação ou até mesmo redução da arrecadação pelo Estado. Em paralelo, observa-se que países que priorizaram políticas fiscais proporcionais e sustentáveis conseguiram preservar altos índices de canalização e fortalecer práticas de compliance, o que deve servir de lição ao Brasil.
Exemplo paradigmático dessa realidade é a Holanda. Com a promulgação da Remote Gambling Act (Wet kansspelen op afstand - KOA), o país legalizou e regulamentou o setor de apostas esportivas, autorizando a atuação de operadores de apostas de quota fixa on-line a partir de outubro de 2021.
Este ano, o governo holandês decidiu elevar o imposto sobre a receita bruta de jogos (GGR) em duas etapas, de 30,5% para 34,2% em 2025, e para 37,8% em 2026. No entanto, relatório encomendado pelo parlamento holandês advertiu para efeitos adversos sobre a sustentabilidade das empresas e sobre os objetivos regulatórios de prote ção do consumidor, causando uma migração de jogadores para o mercado ilegal. A previsão se confirmou: em agosto deste ano, a autoridade holandesa de jogos (Kansspelautoriteit) reconheceu que a meta de arrecadação não foi atingida. Pelo contrário, houve uma queda de €40 milhões na receita anual, com aumento de menos de 4%, frustrando a expectativa governamental de um ganho adicional de €100 milhões.
O Reino Unido também estuda aumentar de 15% para 25% a alíquota relacionada às apostas esportivas, e de 21% para 50% o imposto sobre jogos remotos. Pesquisa realizada pelo YouGov indica, contudo, que 28% dos apostadores regulares migrariam para o mercado ilegal diante desse aumento - dado alarmante para um país que sempre foi referência de regulação no setor.
A Suécia também ilustra os riscos de políticas fiscais agressivas. Em 2023, o governo elevou a alíquota de 18% para 22% sobre a receita bruta de jogos e uma pesquisa realizada pela consultoria H2 Gambling Capital apresentou dados preocupantes no que diz respeito às consequências deste aumento, dado que estimou que a taxa de canalização do país caiu de 92% para 72%.
A Itália, por sua vez, aplica uma das maiores cargas tributárias da Europa: 25,5% para cassinos, 24,5% para apostas esportivas e 24,5% para apostas virtuais, além de um imposto adicional de 3% sobre o ganho bruto. O resultado é um mercado ilegal estimado em € 20 bilhões anuais, que drena recursos estatais e fragiliza o sistema regulatório.
A Alemanha adotou, em 2021, um modelo considerado hostil aos operadores, estabelecendo um imposto de 5,3% sobre o volume apostado (turnover), ao invés do imposto tradicional sobre a receita bruta. Esse modelo desincentiva empresas licenciadas, reduz as taxas de retorno ao jogador e favorece a concorrência ilegal. Em 2024, registrou-se aumento de 18,3% do mercado ilegal de apostas. Estima-se, ainda, que a canalização esteja entre 20% e 40%. Embora o setor movimente cerca de € 3 bilhões por ano, os números contrastam com o Reino Unido, onde o setor gera aproximadamente € 8,3 bilhões de receita anual. Aliada à regulamentação extremamente rigorosa, a alta carga tributária reduz as taxas de retorno aos jogadores, a lucratividade das operadoras e a arrecadação estatal.
A experiência colombiana de aumento da carga tributária também serve de alerta. O Decreto 0175/2024 implementou o IVA de 19% sobre os depósitos realizados pelos jogadores, a partir de fevereiro, como medida de resposta à crise de Catatumbo. No entanto, a medida vem impactando negativamente o setor, gerando uma queda de 32% na receita operacional das operadoras entre março e junho do corrente ano. Além disso, o aumento na tributação reduziu a capacidade de contribuição para o sistema de saúde, com uma queda de 40 bilhões de pesos em janeiro de 2025, para 27 bilhões de pesos a partir de março.
Esses exemplos convergem para uma mesma conclusão: quando a tributação é mal calibrada, o Estado compromete a arrecadação e reduz a credibilidade do marco regulatório, aumentando a ilegalidade e reduzindo a proteção do consumidor.
2. O CENÁRIO BRASILEIRO: ENTRE AVANÇOS REGULATÓRIOS E RISCOS DE RETROCESSO
A regulamentação de apostas no Brasil, consagrada pela Lei 14.790/2023, representou um marco importante para a consolidação do setor. Após anos de indefinição normativa, o país finalmente estruturou regras para um setor que crescia de forma difusa, estabelecendo parâmetros de tributação, compliance e proteção ao consumidor. A introdução de exigências de compliance, políticas de Jogo Responsável e controles de integridade representou um avanço inédito no país, garantindo um ambiente de negócios mais seguro e transparente.
A lei fixou alíquota de 12% sobre a receita bruta das operadoras (GGR) e 15% sobre os ganhos líquidos dos apostadores,observado o limite mínimo de isenção aplicável nos termos da lei. Em relação aos apostadores, a Receita Federal estabeleceu uma regra de isenção para os prêmios de menor valor, de forma que a tributação de 15% sobre os prêmios líquidos (diferença entre o valor do prêmio e o valor apostado) é aplicada somente aos ganhos que excedam o limite de isenção.
Embora ainda em fase inicial de adaptação, o setor rapidamente demonstrou seu potencial: em 2025, somente no primeiro semestre, foram arrecadados R$ 3,8 bilhões em tributos, com receita bruta total de R$ 17,4 bilhões. No entanto, menos de dois anos após a promulgação da lei, o governo federal editou a Medida Provisória 1303 de junho de 2025, que previa mudanças profundas, revisando as alíquotas estabelecidas, criando novos tributos, bem como vem estudando maneiras de cobrar retroativamente impostos dos operadores de apostas de quota fixa.
Nesse sentido, o Relatório Anual de Fiscalização da Receita Federal (2025) destacou a necessidade de ação de medidas estruturantes para a sustentabilidade do mercado de apostas de quota fixa. A Portaria Conjunta 3/2025, por sua vez, criou um grupo de trabalho com integrantes da Receita Federal e da Secretaria de Prêmios e Apostas para subsidiar a proposta de um “programa de conformidade para regularização de obrigações tributárias em relação ao período pretérito à autorização, para as pessoas jurídicas autorizadas”.
Em junho deste ano, o Presidente da República editou a Medida Provisória nº 1.303/2025, que previa o aumento da tributação sobre as plataformas de apostas de 12% para 18%, com início de vigência em novembro, sob o argumento de necessidade fiscal. No entanto, o Congresso Nacional não apreciou a matéria dentro do prazo constitucional, o que resultou na perda de sua eficácia por decurso de prazo — uma rejeição tácita.
Apesar disso, a intenção do Governo de elevar a carga tributária sobre o setor permanece evidente. Prova disso é que, em 9 de outubro, logo após a caducidade da MP 1.303/2025, a bancada do Partido dos Trabalhadores na Câmara dos Deputados protocolou o Projeto de Lei nº 5.076/2025. Diferentemente da medida provisória, que abrangia diversos temas financeiros e tributários, o novo projeto tem foco exclusivo na majoração da taxação incidente sobre as apostas de quota fixa.
A elevação de impostos proposta é excessiva, descontextualizada, deixa de observar todo o ecossistema de apostas e pode levar a uma alta elevação das apostas em mercados ilegais, o que gerará um enormidade de prejuízos e danos à população de um modo geral, com a perda da arrecadação e consequente redução de políticas públicas, aos apostadores que serão submetidos a jogos ilegais, sem garantias, regras e toda a política de jogo responsável e às empresas de apostas de quota fixa que, com a redução de sua rentabilidade podem desistir do mercado nacional e deixar de implementar e aumentar sistemas que visam a segurança e a rentabilidade dos jogos.
Ainda mais preocupante é a discussão sobre a cobrança retroativa de impostos. O tema, levantado na CPI das Bets, pelo secretário da Receita Federal, prevê que cerca de 135 operadores paguem tributos relativos ao período anterior à regulamentação, com estimativa de arrecadação superior a R$ 12 bilhões. Embora sedutora do ponto de vista fiscal, a medida fere frontalmente princípios constitucionais da anterioridade e da segurança jurídica, criando um precedente de incerteza que pode afastar investidores e diferentes setores da economia e desencadear uma onda de judicialização.
A insegurança jurídica, nesse aspecto, é amplificada pela quebra da previsibilidade fiscal, minando a credibilidade do ambiente de negócios no Brasil e ameaçando a sustentabilidade do mercado formal. Além disso, a cobrança retroativa é o principal vetor da instabilidade constitucional. Ou seja, a exigência de tributos sobre fatos geradores anteriores à Lei 14.790/2023, além de inconstitucional, é juridicamente indefensável, configurando um potencial abuso do poder estatal.
Esse conjunto de iniciativas - aumento de alíquotas, cobrança retroativa e criação de novas contribuições - ameaça instaurar um ambiente de instabilidade regulatória. O setor, que já enfrentou custos elevados de outorga - R$ 30 milhões por licença -, investimentos robustos em publicidade, tecnologia e segurança da informação, agora teme que haja aplicação de regras mutáveis, onerosas e de difícil previsibilidade, inviabilizando a manutenção do setor no Brasil, abrindo espaço para os operadores ilegais.
O risco é claro: ao tentar maximizar a arrecadação em curto prazo, o Estado compromete a própria sustentabilidade do mercado regulado. Patrocínios esportivos podem ser cortados, empregos podem deixar de ser criados e, sobretudo, a confiança de consumidores e investidores pode se deteriorar rapidamente. Nesse cenário, a pergunta que se impõe é: estaria o Brasil repetindo o erro de outros países, transformando uma oportunidade em um salto no escuro? A resposta tende a ser positiva se as ações do governo e do parlamento mantiverem esse rumo.
3. A ARMADILHA DO EXCESSO TRIBUTÁRIO: INSEGURANÇA JURÍDICA E EFEITO CONFISCATÓRIO
A discussão sobre a elevação da carga tributária no setor de apostas e, em especial, sobre a cobrança retroativa de impostos, expõe uma série de riscos jurídicos e econômicos que não podem ser ignorados. Trata-se de um campo em que a pressa e a ganância fiscal podem gerar efeitos contrários aos objetivos perseguidos, corroendo a base de arrecadação, fragilizando a própria legitimidade do marco regulatório e fortalecendo mercado ilegal, que não possui qualquer proteção aos apostadores e ainda pode financiar o crime organizado.
A proposta de exigir tributos referentes ao período anterior à vigência da Lei 14.790/2023 viola diretamente o art. 150, inciso III, alínea “a”, da Constituição Federal, que veda a exigência de tributo em relação a fatos geradores ocorridos antes da vigência da lei que os instituiu ou majorou. Além disso, os princípios da anterioridade anual e da anterioridade nonagesimal (art. 150, III, “b” e “c”) reforçam a exigência de previsibilidade. O contribuinte deve ter condições de conhecer previamente a carga tributária a que estará sujeito, para organizar sua atividade econômica. Aplicar regras novas a situações passadas não é apenas juridicamente vedado, mas também reduz a confiança de agentes que já fizeram investimentos para se adaptar ao regime regulado. Tal exigência, ao atingir de forma retroativa os agentes econômicos, configura ainda afronta ao princípio constitucional da livre iniciativa, previsto no art. 1º, inc. IV, pois compromete a segurança jurídica e a estabilidade necessária para o desenvolvimento de suas atividades.
Esse retrocesso normativo viola ainda o art. 11 da Lei Complementar 95/1998, que exige clareza e previsibilidade na redação das normas. A imposição retroativa transforma o marco regulatório em um terreno movediço, incompatível com a segurança jurídica necessária a um setor que movimenta bilhões e exige planejamento de longo prazo.
O art. 150, inciso IV, da Constituição Federal, por sua vez, proíbe a utilização de tributos com efeito de confisco. A elevação abrupta de alíquotas, somada à possibilidade de novas contribuições como a CIDE-Bets, ameaça ultrapassar o limite da razoabilidade, comprometendo a própria sobrevivência econômica das operadoras.
Segundo a Associação Nacional de Jogos e Loterias (ANJL), somadas todas as obrigações atuais (tributos, pagamentos de outorgas, entre outros), o setor arca com uma carga tributária de aproximadamente 42%. Com os novos encargos, essa proporção pode ultrapassar níveis já extremamente elevados, tornando-os inviáveis, pois além de comprometer as margens de lucro, impossibilitará patrocínios esportivos e desestimulará investimentos em inovação e compliance. Quando a tributação deixa de ser instrumento de arrecadação e passa a inviabilizar a atividade, configura-se o confisco.
O aumento excessivo de tributos empurra consumidores para alternativas não reguladas. Pesquisa realizada pela LCA em parceria com o Instituto Brasileiro do Jogo Responsável (IBJR) estima que o mercado ilegal movimenta entre R$ 26 bilhões e R$ 40 bilhões por ano, sendo que a perda na arrecadação gira em torno de R$ 7,2 bilhões e R$ 10,8 bilhões anuais. O efeito é duplamente nocivo: além de reduzir a receita estatal, expõe o consumidor a riscos de fraude, falta de pagamento de prêmios e ausência de mecanismos de jogo responsável.
A experiência internacional confirma esse risco. Holanda, Suécia e Alemanha enfrentam queda nas taxas de canalização após aumentos tributários, o que significa que cada ponto percentual a mais em impostos pode significar milhares de jogadores a menos no mercado regulado, o que gera, consequentemente, a desproteção desses apostadores.
Além disso, quanto maior a ânsia arrecadatória, menor tende a ser a arrecadação efetiva, comprometendo políticas públicas em diversos setores da economia. Somente no primeiro semestre, foram destinados R$ 2,14 bilhões para áreas como esporte, turismo, segurança pública, seguridade social, entre outros. No entanto, esse fluxo de recursos tende a ser comprometido diante de um cenário de instabilidade fiscal. Ou seja, a elevação desproporcional da carga tributária não afeta apenas as empresas do setor, mas desencadeia um efeito dominó sobre toda a cadeia econômica que depende da arrecadação do setor.
Em resumo, a busca por uma arrecadação imediata e inflada tende a enfraquecer um setor que poderia ser altamente contributivo para o desenvolvimento econômico e social do país. O desafio central é encontrar o equilíbrio entre tributação justa e sustentabilidade do mercado, evitando que o excesso fiscal se converta em veneno contra a própria base de arrecadação que se pretende fortalecer.
4. CONCLUSÃO: O CAMINHO PARA UMA TRIBUTAÇÃO EQUILIBRADA E SUSTENTÁVEL
O debate sobre a tributação das apostas de quota fixa vai muito além de uma mera disputa fiscal. Ele representa uma decisão estratégica que pode determinar se o Brasil consolidará um mercado regulado sólido, competitivo e capaz de financiar políticas públicas relevantes, ao mesmo tempo em que protege a população brasileira com regras rígidas a empresas que operam no mercado regulado, ou se, ao contrário, cairá na armadilha de repetir erros já verificados em outros países - sufocando o setor legal e fortalecendo o mercado clandestino.
A experiência internacional é categórica: aumentos desproporcionais da carga tributária raramente se traduzem em maior arrecadação. Ao contrário, tendem a estimular a fuga de consumidores para o mercado ilegal, desincentivar investimentos e corroer a credibilidade regulatória. O mesmo se aplica à cobrança retroativa, medida que afronta princípios constitucionais elementares e inaugura um cenário de insegurança jurídica incompatível com qualquer ambiente de negócios sustentável. A admissão da retroatividade na cobrança de tributos estabelece um precedente de extremo perigo para o futuro das empresas no Brasil, pois se anula a previsibilidade, transformando o planejamento financeiro e a tomada de decisões de investimento em um exercício de alto risco e incerteza.
No Brasil, o risco de que a tributação se converta em verdadeiro instrumento de confisco é concreto. A combinação de elevação abrupta de alíquotas, criação de novas contribuições como a CIDE-Bets e retroatividade fiscal coloca em xeque não apenas a sobrevivência econômica das operadoras, mas também a continuidade de patrocínios esportivos, o investimento em políticas públicas e a arrecadação pública.
É preciso compreender que a tributação não pode ser guiada por impulsos imediatistas. Ela precisa ser calibrada de modo a conciliar arrecadação eficiente com o incentivo à permanência dos agentes no mercado regulado. O caminho mais adequado é buscar uma estrutura tributária moderada, previsível e juridicamente segura, que permita ao setor crescer, gerar emprego e investir em medidas de compliance, ao mesmo tempo em que assegura receitas estáveis e crescentes ao Estado.
Para tanto, deve-se levar em consideração algumas diretrizes, como:
a) Respeito absoluto à Constituição Federal, afastando qualquer tentativa de cobrança retroativa;
b) Estabilidade regulatória, evitando mudanças abruptas que prejudiquem investimentos de longo prazo;
c) Carga tributária calibrada, que preserve a atratividade do mercado legal e desestimule a migração para plataformas clandestinas;
d) Monitoramento contínuo do impacto fiscal, com implementação de indicadores de arrecadação e canalização;
e) Diálogo institucional, envolvendo governo, setor privado e sociedade civil na definição de políticas fiscais equilibradas.
Como se observa, o dilema tributário das apostas de quota fixa exige visão estratégica. A questão não está em arrecadar ou deixar de arrecadar, mas em decidir se o país arrecadará de forma sustentável ou se, em troca de um ganho imediato, colocará em risco a própria capacidade do Estado de financiar políticas públicas - já em execução e que tendem a se expandir com o crescimento do mercado legalizado.
Portanto, o Brasil não pode arriscar um salto no escuro. Em um setor fortemente sensível à tributação, a prioridade deve ser a construção de um ambiente regulatório estável, transparente e competitivo — capaz de atrair investimentos sustentáveis, assegurar a proteção dos consumidores e gerar receitas consistentes no longo prazo. A experiência internacional demonstra que, quanto mais equilibrada, estrategicamente planejada e gradualmente implementada for a política tributária, maior será sua eficácia arrecadatória e mais sólido se tornará o mercado regulado.
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Marcela
April 30, 2024
Exceptional
